“Urutu Cruzeiro jura pela cruz que tem em sua cabeça, que, quando não mata, aleija!”
por Juliane Quinteiro* para Cachoeiras Seguras
Junho/2019
“Urutu Cruzeiro jura pela cruz que tem em sua cabeça, que, quando não mata, aleija!”
Se você já ouviu esse ditado popular deve ter achado um tanto exagerado, entretanto a frase expressa bem o perigo que os animais venenosos podem provocar.
Ao falar sobre acidentes com animais peçonhentos pensamos em algo distante, fora do nosso cotidiano, mas é só fazer uma pequena reflexão que começamos a lembrar de histórias sobre cobras, aranhas e outros bichos, ocorridas conosco, com algum amigo ou parente. Em 2017, tais histórias acabaram de forma trágica para quase 300 pessoas, foram registrados 278 óbitos no Brasil ocasionados por picadas de animais peçonhentos. Em 2016, ocorreram mais de 170.000 acidentes no país, causando transtornos físicos, psicológicos e sociais. A alta frequência em que essas emergências médicas ocorrem no mundo fez a OMS classificar o problema como uma Doença Tropical Negligenciada.
No Brasil
No Brasil, os principais grupos que provocam acidentes são cobras, aranhas, escorpiões, taturanas, abelhas e águas vivas. Os casos acontecem com maior frequência no verão e primavera, quando ocorre o período de reprodução desses bichos e maior incidência de pessoas em trilhas, cachoeiras e praias.
Para curtir a natureza e não fazer parte desses números, vale seguir algumas dicas:
Em trilhas
- Use calçados fechados, calças e mangas longas, isso pode evitar encostar diretamente a pele em taturanas e em plantas urticantes. Botas tipo coturno e perneiras com couro novo protegem contra picadas de cobras, aranhas e escorpiões;
- Faça silêncio, pois o som pode irritar abelhas e vespas;
- Atenção onde pisa, a primeira defesa de muitos animais é a camuflagem, em troncos caídos, em folhas e galhos secos e pedras podem ter cobras, aranhas e escorpiões praticamente invisíveis;
- Cuidado com formigueiros, muitas picadas de formigas podem levar à quadros graves de alergia;
- Ao encontrar um animal, principalmente os grupos já citados, afaste-se com cautela, não se aproxime para tirar fotos e alerte seus companheiros.
Em ambientes rurais, naturais e urbanos com incidência de animais peçonhentos:
- Use luvas e perneiras de raspas de couro para atividades em vegetações;
- Examine roupas, calçados, toalhas de banho e de cama antes de usá-los;
- Afaste camas de paredes e não pendure roupas;
Em caso de acidente
- Procure ajuda médica imediatamente;
- Para acidentes com cobras, escorpiões, aranhas e taturana, se possível, lave o local com água e sabão para diminuir as chances de infecções.
- Não tome garrafadas, bebidas alcoólicas, nem faça torniquete ou aplique substâncias químicas ou naturais no local da picada, pois tudo isso piora o estado do paciente, podendo levar a sequelas graves, como a amputação de membros e morte.
- Para animais peçonhentos de importância médica, como algumas cobras, escorpiões, aranhas e taturana, o tratamento ocorre com soros específicos, ou seja, para cada tipo de veneno existe um soro especifico. Este é o único tratamento eficaz, não existe um soro universal.
- Lembre-se, você não está indo ao veterinário, portanto não pegue o animal! Isso pode agravar o caso ou até mesmo acidentar outras pessoas. A equipe médica deve distinguir o tipo de envenenamento pelos sintomas apresentados pelo paciente, e assim aplicar o soro específico para o tratamento.
Acima, exemplos de camuflagem: 1 - inseto 'Esperança' em folhagem; 2 - pássaro alma de gato entre os galhos; 3 - mariposa entre folhas; 4 - sapo no chão; 5 - cobra no barranco; 6 - grilo na grama. Os animais das fotos 3, 4, 5, 6 foram encontrados na trilha Cachoeira do Engordador no Parque Estadual Cantareira, São Paulo. Embora não ofereçam perigo ilustram bem como podemos estar perto de animais sem perceber sua presença. Fotos: Juliane Quinteiro
Acima - animais peçonhentos são aqueles que possuem um aparelho inoculador de veneno, como uma presa ou ferrão. Os animais das fotos 1 e 2 são respectivamente: aranha do gênero Nephila e Mamangáva, suas picadas causam apenas um pequeno desconforto físico. Nas fotos 3 e 4: cobras do gênero Bothrops, jararaca e urutu cruzeiro, ambas causam acidentes graves. Fotos: Juliane Quinteiro
O Hospital Vital Brazil do Instituto Butantan presta assistência médica especializada em picadas de animais peçonhentos, também oferece orientações telefônicas gratuitas, sendo um importante suporte na identificação e tratamento desses acidentes em todo o Brasil. Contudo, a sociedade está correndo o risco de perder esse serviço, com o possível fechamento da unidade e reestruturação dos serviços prestados. Leia mais no link:
Para saber mais sobre prevenção e tratamento de acidentes com animais peçonhentos, acesse:
* Juliane Quinteiro é bióloga e apaixonada por trilhas, trabalhou 9 anos no Instituto Butantan. "Possui graduação em Ciências Biológicas pelo Centro Universitário São Camilo (2009) e aprimoramento em Museologia, Educação em Saúde, História da Ciência e Comunicação, é pós-graduada do curso A Arte de Contar Histórias: Abordagens poética, literária e performática. Tem experiência na área de Educação com ênfase em Educação não formal e desenvolve projetos que aproximam a sociedade com a cultura científica, por meio da contação de histórias, de jogos, de vivências e de outras formas lúdicas." ( no Site do SISEMSP, Sistema Estadual de Museus - https://www.sisemsp.org.br/redederedes/artigos/nucleo3/a13.html )
Ilustrações: fotos de Juliane Quinteiro e fotos under CC0 license
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